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A fraternidade fortalece o Turismo

Carlos Alberto Godinho | 15-01-2021 A fraternidade fortalece o Turismo

Carlos Alberto Godinho é o Diretor da Obra Nacional da Pastoral do Turismo (ONPT). A ONPT é um organismo da Igreja Católica, em Portugal, dependente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana (CEPSMH), constituída como meio de promover a Pastoral do Turismo, a nível nacional e a congregar toda a atividade humana para o bem comum.


STELLA (ST) – Como descreve o impacto da pandemia em concreto na área do turismo religioso e de peregrinação? Como se readaptou a ONPT a esta nova realidade, em termos de trabalho e de representação?

ONPT – A pandemia teve um forte impacto no turismo religioso, limitando a sua ação, como nas demais áreas do turismo, ou produtos turísticos, para usar a denominação própria. As Igrejas, Museus de Arte Sacra e demais espaços de turismo religioso tiveram de fechar, num primeiro momento, e de se readaptar para permitir visitas seguras. As limitações foram muitas, mantendo-se um número de visitantes muito inferior ao que se registava em período anterior. As peregrinações foram mais afetadas, precisamente pela impossibilidade de se efetuarem deslocações, com um forte impacto nos Santuários e nas Agências de Viagens dedicadas a este setor do turismo. A ONPT, sendo um secretariado, apenas teve de adaptar o seu acompanhamento ao setor, que passou da prosperidade à incerteza, com uma presença a incrementar a resiliência, no presente, e a esperança, no futuro, diminuindo também as suas atividades de presença física, inclusive nas suas reuniões, que transitaram para as plataformas digitais. A situação atual do turismo constitui uma forte preocupação para a Pastoral do Turismo, precisamente pelas suas consequências económicas e sociais, na vida das comunidades, das famílias, das pessoas, inclusive com fortes implicações no emprego.

ST – Algo de impressionante e inesperado teve que ver com o cancelamento de atividades e celebrações religiosas. No caso das procissões, festas populares e romarias, por todo o país, antevê que voltaremos ao que era antigamente?

ONPT – Neste momento há que responder à realidade com a qual estamos confrontados; só depois se farão esses diagnósticos ou previsões. Acredito, contudo, que, por um lado, as nossas Comunidades vão retomar as suas expressões religiosas e culturais – património religioso imaterial –, provavelmente até com maior gosto; embora, por outro, sabendo que as gerações mais velhas, porventura mais empenhadas na preservação e dinamização destas manifestações, poderão permanecer mais reticentes ou retraídas na sua realização. Na verdade, tínhamos já muitas expressões de religiosidade popular que estavam com dificuldades de realização, que esta pandemia, eventualmente, poderá vir a agudizar, ou eventualmente a fazer cair. Mas vamos esperar para ver e agir!

ST – A ONPT publicou um documento no qual apresenta as prioridades para os próximos tempos na área da Pastoral do Turismo. Qual o que se lhe oferece destacar em termos de património religioso?

ONPT – O documento que refere foi apresentado no início deste terceiro mandato da ONPT, em 2018. Destacámos três prioridades de ação: acolhimento, património e dioceses. Estas três prioridades estão interligadas: as dioceses têm de cultivar uma renovada sensibilidade para o turismo, para providenciar um verdadeiro acolhimento nas comunidades cristãs e revalorizarem o seu património, colocando-o ao serviço das pessoas, para que o possam fruir, e ao serviço da sua missão evangelizadora. Mas, na hora presente, entendo que o acolhimento volta a ganhar um destaque particular, numa grande proximidade às pessoas e aos grupos que possam vir a visitar-nos. Afinal, trata-se de viver o que constitui o coração da Pastoral do Turismo – o acolhimento –, tão necessário no presente, bem como no futuro, que se aproxima. Acredito que a autêntica fruição turística não será mais apenas um encontro com o património, mas um renovado gosto no reencontro de pessoas e de culturas.

ST – Vários estudos apontam para um ambiente depressivo nas pessoas e nas entidades. Como podem as dioceses e instituições da Igreja marcar a diferença no sentido positivo?

ONPT – Acabei de referir precisamente a importância do acolhimento, mas acrescento que, se para o turismo, antes da pandemia, o acolhimento era já um aspeto a privilegiar, pois a atividade turística é, antes de mais, uma atividade de pessoas para pessoas; no contexto em que nos encontramos e no futuro, pós pandemia, vamos necessitar de revalorizar as nossas atitudes como: encontro, diálogo, partilha e promoção de desígnios comuns. A compreensão da realidade existencial e social, a própria compreensão do mundo, sua organização e governo, vão favorecer o fortalecimento de relações interpessoais e de novas organizações sociais, creio. Existe um potencial para uma nova compreensão da vivência em sociedade que teremos de valorizar. Assim, mais do que um consumo desmedido das coisas (também no turismo), como o vivido até aqui, teremos de procurar que ela favoreça o reencontro de pessoas e a partilha de vivências. Neste sentido, a Igreja, nas suas diversas comunidades, pode e deve proporcionar esta aproximação e partilha. São múltiplas as possibilidades da Igreja neste serviço às pessoas. Desejo, particularmente, que o turismo seja uma atividade privilegiada no favorecimento daquela nova fraternidade, a que nos apela o Papa Francisco.

ST – Qual o convite que nos deixa de forma a podermos contribuir, com responsabilidade, para o impulso necessário na área do turismo?

ONPT – Para já o apelo terá de ser de uma profunda atenção às pessoas: não só àquelas que desejam retomar a atividade turística, fruindo de condições semelhantes às do passado; mas, muito especialmente, às que vivem desta atividade económica e veem os seus negócios em risco, ou as que caíram já na situação de desemprego. Depois será a oportunidade de contribuirmos também com as nossas possibilidades para uma retoma de uma atividade sustentável. Numa atitude concertada de relação com outros operadores, capaz de potenciar ofertas de visita muito mais ricas do ponto de vista cultural, humano e espiritual. A oferta da Igreja compreende- se sempre a partir de uma visão global da pessoa, da sua dignidade e criatividade, atendendo aos mais profundos anseios das pessoas e das comunidades.

ST – Agradece ao Dr. Alexandre Marto, à Dra. Purificação Reis e ao Sr. Pe. Carlos Alberto Godinho o tempo que dedicaram à entrevista da STELLA e as mensagens de esperança fundamentada na certeza de que unidos podemos construir relações novas e uma sociedade melhor a partir de Fátima e da Mensagem que Nossa Senhora deixou à humanidade. Obrigada.

Artigo publicado na Stella n.701 | Janeiro 2021